Eu tenho tido sempre uma posição muito crítica em relação a Portugal e mais benevolente em relação ao que vejo por cá em terras hispânicas ao ponto de às vezes me questionar se estarei deslumbrada. Mas não, não estou.
Se há aspectos que verdadeiramente me impressionam pela sua eficiência, por exemplo a saúde, há outras questões que são um verdadeiro buraco negro. Uma delas é a questão da construção e da corrupção imobiliária quase instituída.
Todos os anos se constroem, em Espanha, 800 mil casas, um valor superior à soma da edificação em Inglaterra, Alemanha e Itália. E isto porque 1997 com a revisão da Lei do Solo considerou-se que todo o solo rústico era susceptível de ser urbanizado. Ou seja, que milhões de hectares passavam a estar disponíveis. Logicamente os municípios viram nisto uma oportunidade de gerar receitas e foi assim que, em poucos anos a superfície edificada aumentou 40 por cento. A somar a isto são admitidos os acordos urbanísticos, um mecanismo legal através do qual um promotor com solo não apto para a construção pode negociar com a câmara a reclassificação dos terrenos e o volume de construção se paga uma compensação. Tudo passou a ser permitido.
O cenário é concluído com um último dado: o investimento imobiliário é utilizado como refúgio do "dinheiro negro" de várias procedências. Em Espanha, constata o Banco central, circulam um terço das notas de 500 euros da União Europeia, e é admitido que cerca de 25 por cento do PIB corresponde à "economia submersa". Ou seja, que escapa à tributação e encontra investimento - "lavagem"- no sector imobiliário. Nas áreas de influência das grandes cidades existem 1,29 milhões de casas vazias e nas províncias costeiras são perto de 639 mil as residências não ocupadas. Estes são só alguns factos e números da calamidade.
Mas nem tudo é assim tão mau
Este fim de semana - em que estive pela Costa Branca (Valência e Alicante) - li no El País com contentamento que o Tribunal Superior de Justiça valenciano advertia que "La urbanización de millones de metros cuadrados de suelo al margen de los planes generales de ordenación urbana no es compatible con un desarrollo sostenible" ao mesmo tempo que paralisava um plano urbanistico em Parcent, uma localidade alicantina onde vivem 1.000 pessoas e onde estava projectada a construção de um mínimo de 1.500 novas casas. Pelo menos a justiça vai funcionando e a obra foi condenada antes de ser iniciada...
Os meus óculos-filtro de turista
Ao olhar à minha volta quando se passa na maior parte das áreas das províncias de Valência e Alicante é que há ali um cancro cavalgante. A sério. É impressionante como as casas trepam pelas encostas das montanhas, caem até aos limites das escarpas. E apesar do caos já dominante é ainda mais surpreendente a concentração de guindastes que se pode ver em cada quadrado de 100m de lado. Ou seja, a grande obra continua e todo o cenário é complementado com prolíferos cartazes em inglês e alemão que anúnciam as melhores casas em Espanha, em cenários idílicos... E vivam todos os Benidorm desta costa!
Na imagem: A mancha verde lá atrás já não existe. Agora vêem-se bandas imensas de moradias.
13 November 2006
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